quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Não fui eu quem disse, mas Alberto Moravia


" (...) Como se sabe, o argumentista é aquele que escreve, em colaboração com outro argumentista e com o realizador, o desenvolvimento das cenas de que se compõe o filme. No guião, um por um, segundo o desenrolar da ação, são minuciosamente indicados os gestos e as palavras dos actores e os diversos movimentos da máquina. O guião é portanto ao mesmo tempo drama, mímica e técnica cinematográfica. Ora, se bem que a acção do argumentista seja de primeira importância e venha imediatamente depois da do realizador, por motivos inerentes ao progresso da arte do cinema ele fica sempre irremediavelmente subordinada e obscura. Se de facto se julgam as artes do ponto de vista de expressão directa, e não se vê de outro modo como na verdade poderiam julgar, o argumentista é um artista que, apesar de dar o melhor de si ao filme, não tem a consolação de ver reflectida nele a sua personalidade. Assim, com todo o seu trabalho criador, ele não pode ser então um fornecedor de achados, de invenções, de expedientes técnicos, psicológicos, literários; pertence então ao realizador usar esta matéria segundo o seu gênio e, em suma, de se exprimir. O argumentista, portanto, é o homem que fica sempre na sombra, que sua seu melhor sangue para o sucesso de outros; e que, embora o exito do filme dependa dois terços dele, nunca verá seu nome nos cartazes publicitários, onde são, pelo contrário, indicados os do realizador, dos actores e do produtor. Ele pode, é verdade, como acontece frequentemente, alcançar nome neste seu mister subalterno, e ser pago muito bem; mas nunca pode dizer: "este filme fi-lo eu." Isso pode dizê-lo somente o realizador, que, com efeito, é o único a assinar o filme. O argumentista, pelo contrário, deve contentar-se com trabalhar pelo dinheiro que recebe, o qual, queira-o ou não, acaba por transformar no verdadeiro e único fim de seu trabalho. Assim, ao argumentista não cabe senão gozar a vida, se é capaz disso, com aquele dinheiro que é o único resultado do seu trabalho, passando dum argumento para outro, duma comédia a um drama, dum filme de aventuras a um sentimental, sem interrupção, sem pausas, um pouco como em certas governantas que passam duma família para outra sem terem de se afeiçoar a qualquer criança, indo os frutos dos seus esforços todo para as mães, pois só essas têm o direito de chamar à criança seu filho. (...)"

In: O desprezo, pp. 49-50. Editora Ulisséia. 1972. Tradução de Maria Tereza de Barros Brito.

PS. mantive os termos em português de Portugal, pois é lusa a minha edição de "O Desprezo". Não sei se o livro foi publicado no Brasil, mas de qualquer forma, entenda-se por argumentista o que chamamos por roteirista, máquina é a câmera e guião, é como os portugueses chamam ao roteiro.

PS2: "O desprezo" foi filmado por Godard, em 1963. É um dos seus melhores filmes. Mas sobre "Le Mepris", falaremos depois.

2 comentários:

Anônimo disse...

Professor Paulo,
Vamos morrer abraçados nesta zona de rebaixamento. Nem a volta do Vampeta deu jeito.
Viva o "Borboletas Amarelas"
Também tenho um blog...apareça.
www.luispaiva.zip.net

Paulo Halm disse...

Bem, com nove ganhamos os 11 do Fluminense... acho que dá pra chegar entre os dez, até o final do campeonato. Ainda mais agora que o Obina voltou, quá-quá-quá... é nessas horas que a gente entende o significado da "alegria de ser rubro-negro".
E o curtinha, ficou legal?