segunda-feira, 12 de novembro de 2007

entranhas cinematográficas ( e ideológicas ) de Tropa de Elite (4)


Starship Troopers, de Paul Verhoven


Fantasia gay SA ( não confundir com Sociedade Anônima, e sim referente às SA, ou Sturmabteilung, grupo paramilitar comandado por Ernst Rhöm, que tinha como característica uma real afinidade ao conceito de "socialismo" nacional, dentro da concepção nacional-socialista que fundamentava o partido nazista e uma concepção homoerótica da virilidade, advinda dos gregos... em suma, era a facção esquerdista e gay do partido nazista, que foi devidamente "expurgada" na famosa "noite dos longos punhais", na qual foram quase todos mortos pelos membros das SS ) dirigida pelo até então esperto diretor holandês radicado em Hollywood.
O filme é uma caricatura, o que foi confundido pelos admiradores de Verhoven como um esculacho ao culto do herói, tão caro ao cinema ianque ( pelo menos o cinema ianque dos grandes estúdios, das famosas "majors" ).
Mas no geral, parece fascinado pelo fetiche das fardas, por uma visão de uma sociedade militarizada onde os civis são cidadãos de 2a classe, pelo culto à violência, reproduzida com um sentido quase sexual ( o ato de matar e morrer comparado a um orgasmo ), em suma, uma idealização do soldado como macho superior num mundo exclusivamente masculino, no qual as mulheres são seres inferiores ( só admitidas quando "masculinizadas" ) e onde sentimentos nobres como a lealdade, a fraternidade e o amor ( e claro, o sexo ) só podem ser aceitos entre os iguais. Entendendo igualdade aí restrita à elite da sociedade, ou seja, aos homens. A velha tese boiola que, dizem as más línguas, fazia a cabeça dos gregos ( ..."ou seria dos persas", como diria o personagem gay interpretado por Carlão Kroeber, no delicioso "Guerra Conjugal", filme de Joaquim Pedro de Andrade, sobre o qual um dia falaremos ).
A citação do filme do Verhoven ( que realizou grandes filmes como Turkish delight, Soldado Laranja, Conquista Sangrenta, Robocop, antes de entrar em decadência bem remunerada com Atração Fatal e Showgirls e finalmente, este Starship Troopers ) é pura provocação: não há exatamente pontos de referência entre Tropa de elite e essa tropa estrelar, além do fato do culto ao poder "regulador" das tropas de elite militar na vida social e do uso da tortura como forma eficaz de se vencer uma guerra. Lembremos o filme do Verhoven: ao final, o oficial da Gestapo futurista preconizada no filme tortura o inseto-cerebro ( e ânus ) para obter as informações necessárias para derrotar o exercito de baratas e grilos gigantescos que ameaça a Humanidade. E é através da tortura que a Humanidade triunfa. Ou seja, é um líbelo em defesa da tortura como forma legítima de se combater o "mal" e fazer o "bem" triunfar.
Pensando bem, há muitos pontos de convergência.
De certa forma, a caricatura até bem humorada de Verhoven foi levada a sério pelo Padilha, que faz dos seus "caveiras" um poder regulador dentro de uma "cidade partida", uma espécie de cruzados impolutos e incorruptíveis, e cujo uso da tortura como forma de defesa do bem contra o mal.

Note-se que, da mesma forma que em Full Metal Jacket, em Starship Troopers há o processo cruel de "educação" militar, que transforma homens supostamente civilizados em armas letais. Tudo em nome da defesa da "civilização" contra a "barbárie".

Mas o que em Starship troopers é caricato, debochado e, mesmo, paródico, em Tropa de elite é tratado como um ritual de purificação e depuração dos fracos e indesejáveis ( se bem que, como na cena da "aula de estratégia", com belas tiradas de humor ).

A ação de Tropa de Elite se passa em 1997, um passado recente. Já a de Starship Troppers ocorre num futuro distante.

Um filme mostra o passado recente para "justificar" a violência dos dias presentes. O outro mostra um futuro para "alertar" dos perigos que a ameaçam a humanidade que se deixa desarmar.

Cara e coroa de uma mesma moeda - diante de uma ameaça à civilização, é necessário recorrer às forças acima das leis, da moral, da ética, pois somente estas conseguirão derrotar o mal. Nas entrelinhas, a carta branca que a sociedade ( geralmente, os membros mais aquinhoados das sociedades, a elite ) dá aos fascistas para impôr a ordem e garantir sua sobrevivência.

Recomendo verem Starship Troopers e compararem com Tropa de Elite. Verão que as coincidências são muitas. O problema é que no filme do Verhoven dá pra rir... enquanto que Tropa de Elite provoca uma inevitável sensação de medo.

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