sábado, 30 de junho de 2007

Durán


Meu mestre.
O primeiro a acreditar que eu poderia torna-me um roteirista. Ele me disse uma vez ( e eu repito aos que querem escrever um roteiro) :
-" Nunca entre de chofre ( numa cena)".
Para ele, a melhor forma de se abordar um assunto era a subjetividade. Não se precipitar nem entregar o ouro dramático de uma cena. Andar em torno do assunto, como um toureiro que provoca o touro, de modo a esticar a tensão da cena até o momento adequado.
Além de ser o melhor roteirista brasileiro ( apesar de chileno ) em atividade, é um grande diretor. Aprendi muito com ele, e ainda espero aprender muito.
Após uma dieta forçada de 20 anos, por conta da estupidez dos comerciantes de cinema e da miopia dos burocratas do MinC, ele voltou a filmar e nos legou o melhor filme brasileiro deste ano: "Proibido Proibir".
Quem sabe o sucesso e os prêmios que o "Proibido Proibir" vem amealhando convençam algum distribuidor a lançar em dvd seu primeiro longa, "A cor do seu destino". Realizado há 20 anos atrás, é um filme que merecia ser visto e revisto. Muito superior que a maioria dos filmes brasileiros atuais. Tenho plena certeza que faria um sucesso com os jovens de hoje - o danado do Duran consegue como poucos reproduzir os anseios e as insatisfações do jovens. Talvez porque, apesar de já ter passado dos 60 anos, continue o garoto chileno que, no inicio dos anos 60, andava de lambreta e matava aulas ( estudou teatro, queria ser ator ) para ver filmes "B" americanos, num cinema pulgueiro qualquer de Santiago.
Agora que lembrei do A cor do seu destino, percebo que é um filme que até hoje me inspira - consciente ou inconscientemente, penso e escrevo meus roteiros dialogando com as lembranças que tenho dele.
Somos amigos há muito tempo, 20 e tantos anos, tempo em que passei de aprendiz, assistente e finalmente, colega.
Estranhamente, nunca escrevi um roteiro para ele... minto, escrevi um tratamento de um longa pra ele, há milênios, mas não sei se ele gostou do que escrevi. Aliás, se ele tivesse gostado eu também não saberia, porque o Durán tem um processo tão louco de escrever que ele muda tão radicalmente os roteiros de uma versão para outra, que seria impossível reconhecer o que eu tinha escrito antes. É de um total desapego à coisa escrita, ele pensa sempre no melhor pro filme, parece imune à essa vaidade boba de escritor que fica o tempo todo defendendo "suas cenas, seus diálogos" - sabe que o roteiro é parte de um todo, e que só existe quando "desaparece" neste todo, que é o filme. Não é à toa que ele é o melhor de todos nós, roteiristas em atividade.
Ele foi ator em três dos meus filmes. Em troca ( na verdade, ia escrever, como punição ), eu "cometi" uma cena do "Proibido".

3 comentários:

Clarisse disse...

Confesso que preferia expor menos minha ignorância e consultar o Aurélio(mentira, o assistente do google). Mas como você adora saber que eu fico frequentando isso aqui...O que vem a ser "entrar de chofre?"

Paulo Halm disse...

Quando ele me falou isso, achei que era uma expressão em espanhol, ou algo no, às vezes, incompreensível portunhol do Duran... mas é uma expressão do mais castiço português. Quer dizer: entrar de supetão, de rompante, abruptamente.

Anônimo disse...

Durán é demais; grande cineasta e professor. Merecedor de todo o sucesso do lindo filme.