sábado, 20 de outubro de 2007

coisas que eu gosto ( de ouvir) 5:



A bossa eterna de Elizeth e Ciro


Disco fundamental para quem deseja conhecer a boa música popular brasileira.
Dois pesos pesados da musica brasileira dando o melhor de si, para felicidade daqueles que apreciam um bom samba.
A divina Elizeth Cardoso, consagrada por interpretações sublimes e pungentes ( considero sua gravação de "Barracão", de Herivelto Martins, no disco ao vivo com Jacó do Bandolim a mais bela interpretação da MPB ) revela aqui seu lado mais descontraido, ao lado do sempre irreverente e malandro Ciro Monteiro.
Sou fã de carteirinha do "formigão", sem dúvida o mais carioca dos cantores da MPB. Apoiado num timbre de voz saboroso, dono de um estilo personalíssimo, Ciro esbanjava alegria.
Ao seu lado, a Elizeth dá um tempo à "diva" e incorpora uma cabrocha cheia de ginga e malandragem. É um disco que celebra a alegria, e que compartilha com os ouvintes o prazer de viver.
Na versão "bolachão", tanto o lado A quanto o B abriam com dois deliciosos "pout-porrys", com duelos entre Ciro e Elizeth, marcados pelo bom humor que contagia o ouvinte. São trechos de canções imortais, cuja letra imediatamente vem à lembrança e é irresistível não unir nossa voz à dos grandes cantores. É o caso de Taí, de Joubert de Carvalho, Adeus Batucada, de Ismael Silva ( por sinal, dois grandes sucessos de Carmen Miranda ), ou Mulher de Malandro, de Heitor dos Prazeres e Meu fraco é mulher, de Conde e Heitor de Barros.
Nestas e nas demais faixas do disco, Elizeth e Ciro são acompanhados pelo regional do Caçulinha ( sim, ele mesmo, o que hoje se apresenta no "circo de horrores" dominical do Faustão, triste aposentadoria para um grande músico ), em ótima forma.
Juntos também a dupla arrasa com "Quando eu penso na Bahia", de Ary Barroso, número cheio de deliciosa teatralidade, bem ao estilo do teatro de revistas - um aspecto da cultura e do show bizz brasileiros lamentavelmente perdidos. Ao ouvir essa faixa, quase é possível "ver" Elizeth e o formigão em um palco imaginário, tal a força visual da interpretação.
Nos momentos solos, o destaque é a emocionante Sei lá Mangueira, que Elizeth canta de forma sublime, talvez a mais bela canção sobre já feita sobre a verde-e-rosa, curiosamente composta pelo rival portelense Paulinho da Viola, com versos de Hermínio Belo de Carvalho: "visto aqui do baixo, mais parece o céu no chão". Que bela metáfora.
Outra boa interpretação de Elizeth é o samba "Louco", de Wilson Batista e Henrique Alves, que anos depois o saudoso João Nogueira iria gravar e associar inevitavelmente à sua carreira: "louco, pelas ruas ele andava, o coitado chorava/ transformou-se até num vagabundo/ Louco, para ele a vida não valia nada, para ele a mulher amada/ era seu mundo".
Já Ciro arrebenta com Certa Maria, composição sua com o poetinha Vinícius de Moraes.
É um disco que não parece ter sido gravado há quase 40 anos. O frescor e força dos intérpretes, a eternidade das canções, o clima de camaradagem que emana das gravações, sempre contagiante, afungentam qualquer sentimento nostálgico.
Um disco pra botar no "repeat" e deixar rolar. Recomenda-se ouvir acompanhado de uma boa cervejinha gelada. Ou melhor, várias.

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