segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

tourinho

Estava aqui, diante do meu computador, limpando meu cachimbo, olhando (mais escutando que olhando ) a chuva, quando Clarisse me fala que o Luiz Carlos Tourinho tinha morrido. Levei um susto. Qual Tourinho? O Biu, diz ela. Fiquei chocado. Aneurisma cerebral, informa o Terra, ao qual recorro para verificar a notícia. Era um garoto, ainda. 43 anos. Que tristeza.

Conheci o Tourinho em 95, quando filmei com ele meu média-metragem Biu, ou Na vida real não tem retake. Ele era ainda pouco conhecido na mídia, apesar de ser um ator bastante requisitado em teatro, de onde era oriundo. Mais especificamente, do Tablado, ícone do teatro infantil nacional, que formou boa parte dos atores que hoje brilham no cinema, teatro e tv, como Andrea Beltrão, Cláudia Abreu, Pedro Paulo Rangel, Malu Mader, etc. Tourinho fez o protagonista, Severino, mais conhecido como Biu, um "boy" que trabalhava numa produtora de comerciais e que sonha virar ator de cinema. Um papel que escrevi, veja só que ambição, para o Renato Aragão. Sabendo disso, Tourinho incorporou o "Didi Mocó" em algumas cenas do filme, mais especificamente na cena em que ele canta e dança uma espécie de "embolada heavy-metal", aliás, um dos momentos que mais gosto do filme.
Depois do Biu, ele fez uma ponta no "Quem Matou Pixote?" do Joffily, que eu escrevi e produzi ( o papel, de um trocador de onibus que dá uma sacaneada no Fernando Ramos, era um nada, apenas uma cena, mas eu pedi ao Joffily para chamarmos o Tourinho, que daria um brilho especial àquela pequena cena ilustrativa da capacidade do homem espizinhar seu semelhante, independente de quão semelhante e fudido ele seja ).

Um dia o telefone toca e atendi ( sim, atendia telefone naquela época, ainda não tinha desenvolvido essa minha fobia que hoje é quase marca registrada ) e era o Bigode, o diretor Luiz Carlos Lacerda me pedindo pra dar uma olhada no Biu, porque haviam lhe falado da performance do Tourinho e ele queria conferir. Fiquei meio cabreiro de emprestar um vhs do filme pro Bigode porque ele é sabidamente homossexual e militante do movimento gay, e o filme fazia algumas piadas, digamos, meio estereotipadas ( o Paulo Betti fazia um diretor de arte gay cheio de trejeitos, mas a intenção era menos debochar da sexualidade alheia e sim, tripudiar de um determinado tipo de artista afetado e presunçoso, que amiúde existe no cinema brasileiro ). Independente disso, e muito cortez, o Bigode viu o filme, elogiou e disse que tinha gostado muito do Tourinho e que ele iria servir pro papel que tinha em mente. Tempos depois, Tourinho aparecia como protagonista do longa "For-All, o trampolin da vitória", fazendo um recruta gay, com interpretação hilária, que remetia aos bons momentos do grande Oscarito. A partir daí, sua carreira deslanchou e ele tornou-se bastante conhecido, fazendo vários trabalhos na televisão.

Ele era realmente muito talentoso e seu tipo físico, miúdo, quase um garoto, era ideal para personagens cômicos, ligeiros, serelepes, gaiatos. Mas ao mesmo tempo, seus olhos azuis tinham uma espécie de doçura, melancolia, que ele, como ator completo que era, sabia usar para interromper uma sapequice e trazer dignidade e dor a seus personagens.

Não acompanho novelas, mas pelo que li no Terra, ele estava brilhando num papel cômico, numa novela da Globo, Desejo proibido. Imagino a consternação e a tristeza de seus colegas.

Na parede ao lado do meu computador há um poster do Biu. Nele, há uma grande foto de Tourinho, encarnando o Biu, apoiado sobre um tripé de câmera e olhando para frente, com um ar sonhador, os olhos azuis alinhados com o horizonte imaginário, como que imaginando um futuro de glórias à sua frente. Ao contrário do Biu, Tourinho teve seu quinhão de sucesso e glórias, merecido.

Era um grande ator. E um garoto muito bacana.

Vai fazer falta.

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